Era dia 7 de fevereiro, domingo. Várias pessoas estavam no Lago Negro em Gramado, no Rio Grande do Sul, seja tomando sorvete, caminhando ou andando de barquinho no lago, mas independente do que estivessem fazendo era possível ouvir uma música suave ao fundo, vindo de um violino.
Homens, mulheres e crianças passaram pelo violinista ao longo do dia. Alguns paravam para admirar a música e contribuíam com moedas e notas, colocando na caixa que estava aos pés dele. Na mesma, havia uma placa: “Eu tenho um sonho e estou correndo atrás. Rumo a Londres”.
“Algumas pessoas olham como se fosse impossível por causa da minha cor. Eu tenho que parar de colocar a culpa nisso, de achar que vai ser mais difícil. Se o mundo não quer me dar oportunidade eu vou criar a minha própria."
Salatiel Pereira, de 20 anos, tocava e fazia um gesto de agradecimento para cada turista que deixava um pouquinho do que estava em seu bolso naquela caixa. Ao sentir a emoção da música, ele fechava os olhos e deixava o som guiar.
O violinista tem o sonho de estudar inglês em Londres, e há dois anos ele toca violino para arrecadar dinheiro em vários pontos turísticos do sul do país.
“Estou dando um tiro no escuro. Para estar tocando e correndo atrás do meu sonho tive que abdicar de muitas e muitas coisas, aniversário de pessoas importantes, amizades...”, conta.
O violinista não lembra quando foi a primeira vez que tocou o instrumento, mas conta que sempre admirou muito a música e por isso decidiu se arriscar tocando nas ruas.
O feedback do público, porém, depende muito do lugar que ele está tocando. Salatiel conta que em Gramado é onde mais tem retorno dos turistas e moradores, mas em alguns lugares já passou por dificuldades, e inclusive já foi assaltado, tendo o seu violino roubado.
“Mesmo eu sendo o homem mais rico do planeta eu ainda iria tocar na rua, pois a experiência é incrível, mas em alguns lugares eu tenho mais apoio. Desde que comecei tive que aprender a administrar meu dinheiro e principalmente meu tempo”, diz.
Salatiel também investe nas redes sociais. Atualmente ele possui uma pequena agência onde, junto com outros profissionais que conheceu ao longo da trajetória, faz gestão de anúncios, estratégia de marketing, social media, design, gestão de tráfego e assessoria para as empresas.
“Antes eu achava que isso não ia dar certo, não seria concretizado, mas cara, se eu soubesse disso antes... Eu tenho cliente que fala que tem só 500 seguidores, mas não, tem 500 vidas te seguindo. É muito, se souber lidar com aquilo consegue muita coisa. Falam que vai ser difícil porque sou negro, mas se eu ficar preso nisso eu nunca vou sair do lugar, nunca teria saído de casa”, diz.
O violinista, anteriormente, já tocou em projetos sociais e até mesmo orquestras. Mas decidiu que queria se arriscar para arrecadar dinheiro para o sonho dele.
“Me vi em uma situação que eu não queria ficar mais à mercê das oportunidades da vida. Já que o sistema não quer me dar, eu ia criar minhas próprias oportunidades“.
Tocar nas ruas deu uma motivação a mais para o Salatiel. Ele conta que, com isso, desenvolveu mais maturidade e autonomia, além de força para continuar correndo atrás do sonho, que está cada vez mais perto.
“Estou tendo cada experiência, uma mais louca e mais fantástica que a outra. Eu pensei ‘simbora, neguinho’, tenho que me virar."
"Todo esse processo de insegurança acabou aqui. Eu não tenho medo de ninguém e ninguém tem medo de mim. Hoje isso é um estilo de vida pra mim, e eu vou conseguir realizar esse sonho”, afirma.
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